segunda-feira, junho 20, 2011

Uma festa entranhada na vida dos sobradenses

Fala-se da Festa de S. João de Sobrado sobretudo - ou quase só - por causa dos Bugios e Mourisqueiros, das suas danças e das suas lutas. Mas a festa compreende muito mais:
- os ensaios, nos quatro domingos anteriores;
- as cenas de crítica aos acontecimentos do ano
- os rituais agrícolas e a dança do cego;
- e, claro, o arraial, com as bandas e artistas convidados.
É provável que haja em Sobrado quem se interesse apenas por este último aspecto. A maioria talvez goste um pouco de tudo. Os sobradenses realmente conhecedores da memória e identidade da freguesia não podem dispensar os três primeiros elementos. Estes é que fazem a tipicidade de Sobrado. O arraial existe em muitas terras.
Mesmo que não houvesse Comissão de Festas, haveria Bugiada e Mouriscada e tudo o mais. Conta-se que, no passado, já se chegou às vésperas do dia 24 sem Comissão e com tudo por fazer. Mas a festa tradicional, essa, fez-se na mesma.
É por isso que se entende o comentário do presidente da Comissão deste ano quando diz, em declarações ao Jornal Novo de Valongo, que o arraial, sem perder qualidade, "vai ser mais económico, devido à situação que se vive". Mas - acrescenta - "o dia de S. João vai ser exactamente igual ao que tem sido; não cortámos em nada que faz parte da festa".
Para o essencial não falta quem queira e vá participar. Aí não há crise que se note. Pelo contrário: frequentemente, os momentos e tempos de dificuldade aguçam o engenho, espevitam a necessidade de romper, ainda que por um dia, com as preocupações e os sofrimentos. Ser Bugio ou Mourisqueiro é experimentar uma nova forma de existir e adquirir ou revigorar uma identidade individual e, ao mesmo tempo, fortalecer e aprofundar a identidade colectiva. A máscara é, aqui, uma porta que abre para o lado nocturno e misterioso de cada um. Ser Mourisqueiro é iniciar-se na vida social (masculina), assumir um estatuto que só termina com o casamento. A indumentária, as polainas, a espada e a barretina conferem uma posição e abrem caminho a uma "carreira", que aponta, para os melhores, ao posto de Reimoeiro.
Na Festa de S. João de Sobrado, a festa cruza-se com a vida real em cada esquina, em cada hora. Por isso ela própria, sendo um tempo fora do tempo, é também parte indestrinçável do tecido de que é feita a vida dos sobradenses. E, por enquanto, os sinais visíveis não contradizem esta ideia.

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